segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Poesias de Mário Brasil

O Bem e o Mal

Em dois pólos oppostos collocados
Eil-os que surgem. Olham-se calados
Marcham para o combate.
Inimigos terríveis, destemidos,
Nada os impede. Julgam-se offendidos,
É a hora do debate.

Rivaes inconciliáveis, dois gigantes
Intrepidos, ousados e possantes,
De audacia sem igual;
Os seus passos fataes ninguém atalha.
Medem suas forças, fitam-se e à batalha
Decidem-se afinal.

Trava-se então a luta sanguinária,
Indecisa a princípio, é depois vária,
Mas tétrica também,
Porque estes dois leões e contendores
São terríveis rivaes, ameaçadores,
E iguaes no seu desdem.

Horrendo, mais horrendo inda é o combate,
Mas um golpe certeiro ao Mal abate
E rola estatelado!
Triunpho, o prelio é findo! A eterna glória
E a palma soberana da victória
O Bem há conquistado!

Eis agora por terra, ali vencido,
O mal, serpe, hydra, monstro enfurecido
Consigo e sua sorte,
Bradando contra o inimigo, mas em vão,
Porque golpeado foi no coração
E em breve terá a morte.

No momento supremo, o moribundo
Inda envia colírico, iracundo,
Ameaças sem fim
Ao vencedor. Mas tudo é irremediavel,
Pois, fatigado, cála o miseravel
Para morrer enfim!

Santa Maria, 16-10-1909.



***



Na Jaula

Abre-se a jaula. O domador penetra
Fechando a porta calmamente, após,
Embora visse à sua frente um monstro
De hiulcas faces: um leão feróz.

Louco, insensato, dir-lhe-iam todos,
Quando na jaula o desgraçado entrou;
Mas elle achára um coração de pedra
No peito ingrato da mulher que amou!

Eis o motivo que o arrojára a tanto
Sem mesmo apego dar à vida sua;
Luctára embalde e tudo embalde fôra,
Porque sua sorte lhe era triste e crua!

Que lhe importava pois a morte ingrata
Si o que tentára tinha sido em vão?
Morrer, morrer, só lhe restava agora,
Na bocca hiante do feroz leão.

Eil-o pois diante desse monstro horrivel
Ao qual domina com seu nobre olhar,
Fal-o de escravo, mas liberta-o após,
Para a existencia tão cruel findar.

Um salto apenas e o ínfeliz tombava
Dilacerado, sem dizer siquer:
Pude domar um coração de féra
Mas abrandar não pude um de mulher!

Santa Maria, 25-10-1909.